O encontro com Cecília (e um interlúdio metafísico)

Texto originalmente enviado para os assinantes da minha newsletter em 20 de fevereiro de 2021

 Como a maioria de vocês sabe, há alguns meses eu tirei “férias” das minhas atividades virtuais. Poucas semanas depois de aceitar uma promoção, descobri que minha esposa tinha uma gravidez de risco e que precisaria de repouso e cuidados especiais.

Ainda considerei simplesmente diminuir o ritmo das publicações, mas logo aceitei o incontornável: a minha vida concreta me chamava para outro lugar. Era preciso parar — ao menos por um tempo — de escrever.

***

Apesar da natural preocupação com a notícia, creio que ambos reagimos com uma calma quase exagerada, como se estivéssemos nos resignando ao pior.

Essa semi-resignação, creio eu, vinha mais de anos de frustração de que de alguma espécie de elevação espiritual. A notícia de que a bebê podia nascer perigosamente prematura vinha poucos meses depois de termos perdido a primeira gestação. E, por sua vez, a primeira gravidez tinha vindo depois de tantos anos de espera que tínhamos chegado a imaginar que ela nunca viria.

Essa frustração era especialmente dolorosa, pois desde os primeiros meses de namoro eu sabia que Aline era alguém especialmente vocacionada para ser mãe. Imaginar que não teríamos essa experiência foi um sofrimento que me acompanhou durante anos. Nos primeiros deles, eu rezava pedindo por essa oportunidade. Nos últimos, já tinha começado a pedir que Ele me ajudasse a aceitar que não teríamos esse privilégio e que me desse forças para consolá-la.

Foi por isso que a primeira gravidez veio com uma explosão de alegria e, por tabela, a perda veio com uma dor proporcional.

A segunda gravidez, portanto, veio com uma alegria mais contida, cheia de cautela, com o receio implícito que, para usar um clichê, aquilo era bom demais para ser verdade.

Não ajudava, é claro, que aquele luto tenha sido sufocado pela pandemia e pela concomitante desorganização social e isolamento crescente. De repente, estávamos mais ilhados do que nunca, tentando lançar algumas bóias de salvação, enquanto nós mesmo lutávamos para manter nossas cabeças acima da água.

Logo, a notícia do risco de nascimento prematuro veio abafada por toda essa bagagem. Veio daí a semi-resignação — ou pseudo-resignação — de quem calmamente faz o que os médicos pedem, ocupando-se daquele pouco que podíamos controlar: o trabalho, a rotina, a alimentação, a espera.

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Cada semana era uma comemoração.

Sei que é um pouco esquisito o hábito moderno dos pais falarem do tempo da gestação e da idade dos bebês em semanas em vez de meses. Mas agora o compreendo perfeitamente: cada semana era um aumento significativo nas chances de sobrevida e, portanto, uma pequena vitória, uma pequena comemoração.

Vinte e seis, vinte e sete, vinte e oito, vinte e nove semanas. O calendário passava e íamos nos sentindo mais leves. A semi-resignação foi progressivamente dando lugar à felicidade e, quase, à alegria.

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E aí veio o dia do parto.

Apesar de toda a preocupação, nossa bebezinha veio dentro do prazo ideal. A mãe entrou em trabalho de parto normalmente, pouco antes da sua última consulta de rotina.

Mas ainda tínhamos um pequeno susto pela frente. Os equipamentos identificaram sofrimento fetal e foi preciso fazer uma cesárea de emergência. Levaram-me para uma sala para que eu trocasse de roupa enquanto aplicavam a anestesia em Aline. Minha sensação foi que horas se passavam sem que nada ocorresse.

Até que entrei na sala de operação e… bem, é difícil descrever os minutos seguintes. Cada segundo tinha se dilatado. O mundo tinha pisado no freio para que pudesse absorver a importância dos instantes seguintes.

Meu primeiro susto foi ver que Aline não parecia estar reagindo bem à anestesia — os médicos me garantiam que aquilo era normal, que ela estava bem, mas ela estava se tremendo, com dificuldade de falar, com um olhar de preocupação. Era difícil acreditar neles enquanto todos os sinais externos me levavam na direção contrária, enquanto eu ficava perguntando se ela estava bem e ela tinha dificuldade em responder.

Hoje se fala pouco disso, aliás, pois a medicina moderna felizmente tornou os partos muito mais seguros, mas toda gravidez é um ato imenso de coragem. Toda mulher que teve um filho, ao longo da história, arriscou a própria vida durante o processo. Isso é algo que a sociedade parece ter esquecido, mas que se torna imediatamente concreto para qualquer marido que tenha que ver sua esposa em uma mesa de operação.

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Mas, como eu dizia, tudo isso me ocorreu em um segundo. Antes que eu pudesse me assegurar que ela estava bem, veio o instante seguinte, onde os médicos me disseram que eu me preparasse para tirar uma foto, pois a bebê estava saindo. E enquanto uns me diziam isso, outros diziam entre si que ela havia inspirado muito líquido e que não estava ainda respirando bem.

Mal pude tirar o celular do bolso e eles começaram a levá-la para o outro lado da sala, para usar um aspirador e tentar provocar o choro — e foi aí que fiquei travado. Eu não estava seguro ainda que Aline estava bem e agora estava preocupado com a bebê. Todos os meus instintos, depois de anos de convivência, me diziam para não sair do lado de Aline — eu precisava primeiro me certificar que ela não precisava de nada, que estava bem. Mas…. a nossa bebê estava sendo levada para o outro lado da sala, talvez em risco, por pessoas que eu não conhecia, antes mesmo que eu pudesse tocar nela.

Nunca me senti tão dividido. Fiquei alguns segundos paralisados, como se qualquer movimento fosse inadequado. Como se a própria ideia de me mexer fosse absurda.

Quem me tirou do transe foi a própria Aline, que tinha finalmente conseguido balbuciar algo — vá com ela! não saía de perto dela! — me fazendo perceber que aqueles instintos maternais que eu tinha percebido anos atrás estavam mais vivos do que nunca.

E eu fui.

***

E aí veio o instante seguinte, novamente partilhando dessa estranha propriedade onde os segundos se misturam com as horas — o instante em queas enfermeiras estavam usando o aspirador e tentando fazer a bebê chorar.

Uns chorinhos começaram a vir aqui e ali, mas nada muito convincente. Os médicos não pareciam preocupados, mas também não pareciam tranquilos. A cor dela foi melhorando e eles terminaram por decidir que estava bom o suficiente mesmo sem o grande choro e acharam melhor colocá-la no meu colo para que eu a levasse para a mãe.

Obviamente, minha mente estava aceleradíssima, me perguntando o que aquilo tudo significava — ela estava bem mesmo? O que significava o fato dela não ter chorado ainda? Será que seus pulmões estavam com algum problema? Será que ela terá alguma sequela? E Aline — será que ela está precisando de algo? Será que ela está piorando?

Mas tudo aquilo se dissolveu quando peguei Cecília no colo e ela olhou intensamente para mim. Naquele momento, não era mais a preocupação que me tomava, mas algo inteiramente diferente. Todos os meus pensamentos se dissolveram diante de algo muito maior do que eu mesmo: o mistério da vida.

Eu estava diante de algo muito maior do que que minha filha — eu estava diante de uma pessoa.

***

Creio que preciso fazer um breve interlúdio metafísico para dizer o que quero dizer com isso.

Naquele instante, uma das minhas crenças filosóficas básicas, um dos pilares do meu modo de ver o mundo, ganhou uma claridade máxima. Infelizmente, ainda não tive tempo de tentar expressar essa intuição por escrito, tendo apenas esboçado-a em exposições orais no que parece ter sido muitos milênios atrás.

Eis um super-resumo do que quero dizer com isso. A grosso modo, a preocupação fundamental dos filósofos é descobrir a natureza última da realidade. A partir do platonismo, a resposta parecia estar nas ideias, isto é, em certos objetos inteligíveis que, de certo modo, existiriam além do espaço e tempo. Por “ideias”, aliás, não estamos falando aqui em meros pensamentos, mas em noções ao mesmo tempo abstratas e reais, as quais possuem uma existência objetiva que é relevada por um ato de inteligência.

Em outras palavras, a natureza última da realidade estaria mais na ideia do triângulo, por exemplo, do que nos diversos objetos triangulares, os quais refletiriam apenas de modo imperfeito e indireto a essência perfeita do triângulo abstrato.

Contra essa visão surgem as mais variadas interpretações de Aristóteles, as quais, a grosso modo, argumentam que a “triangulidade” é apenas um aspecto dos objetos triangulares, não existindo em si mesmo, mas apenas de modo secundário. Ou seja, a realidade última seria composta de substâncias, isto é, de entes concretos, os quais possuem uma série de características — entre as quais, certas características essenciais de onde surgem as ideias platônicas. Ou seja, de certo modo, não é o “triângulo em si mesmo” que existe, mas uma série de entes que compartilham a característica da triangulidade.

E sim, sei que pareço estar há quilômetros de distância daquele instante — e, para os acadêmicos, provavelmente estou sendo vergonhosamente simplista — mas preciso desagradar gregos e troianos para chegar ao ponto que realmente me interessa — dizer o que eu mesmo penso sobre a natureza da realidade e como essa questão se resolve no mistério da pessoa.

Tem aqui material para todo um seminário de filosofia e metafísica, mas vou logo pular para a conclusão: quanto mais eu medito sobre o mistério da existência, mas me ocorre que há algo de profundamente irredutível na noção de pessoa, uma noção que não cabe perfeitamente em nenhuma das visões descritas anteriormente.

Embora eu concorde com a intuição aristotélica que as substâncias parecem ser o fundamento da realidade, a verdade é que a própria noção de substância é desafiadora. Em que momento essa mesa em que eu escrevo se torna realmente uma mesa? Em um mundo sem humanos, ela seria outra coisa: alimento para cupins, abrigo para guaxinins, brinquedo para um gorila.

As pessoas, no entanto possuem um tipo de substancialidade totalmente distinta dos demais objetos. Mesmo um mero cachorro ou passarinho, aliás, possui uma identidade e um télos. Em outras palavras, além de haver uma clara fronteira entre um ser vivo e o resto do mundo — o que não ocorre entre a caneta e a tampa, entre o armário e a gaveta — os seres vivos também possuem uma intenção, uma direção, isto é, eles são a causa do próprio movimento. Nesse sentido, nem mesmo os animais podem ser reduzido à mera causalidade eficiente ou à matéria que os compõem. Dizer que um cachorro é um punhado de células, um amontoado de carne e ossos, é um erro tão elementar quem nem mesmo uma criança cairia nele.

Em outras palavras, há uma dignidade na vida que vai muito além da dimensão ética e que toca na própria ontologia da existência. É verdade que os triângulos e os números estão além do tempo e espaço, enquanto nós estamos na “prisão escura das três dimensões”, sendo arrastado de um instante para outro, sujeitos à corrupção e à degeneração às quais se submetem todos os entes corporais. Porém, nós temos também uma dignidade especial: não somos meras engrenagens do tempo, mas somos capazes de mover a nós mesmo através dele, construindo o próximo instante por meio das nossas escolhas, além de fazê-lo sempre de olho em intuições que transcendem a dimensão meramente material.

Em suma, a existência de uma pessoa, de uma vida humana, dessa combinação misteriosa entre inteligência e liberdade, é, a meu ver, o aspecto mais espantoso desse mundo.

Essa intuição não é algo que cabe perfeitamente em nenhuma teoria, em nenhum sistema. Mas, ao mesmo tempo, é tudo que importa.

***

Mas voltemos àquela madrugada, ao momento em que primeiro peguei Cecília no colo.

Eu já havia, obviamente, pensando muito naquele instante — em ser pai, em como nossa vida mudaria, nos planos, sonhos e medos. Mas todas aquelas expectativas eram meros pensamentos, isto é, eram meros frutos da minha imaginação. Era coisas que estavam dentro de mim.

Cecília não era nada disso — ela não era um papel social, uma expectativa, um sonho. Ela era uma pessoa. E, enquanto pessoa, ela era maior do que tudo isso. Mesmo sendo pequena como uma bolinha, ela já tinha uma existência que transcendia em muito a mim mesmo.

Sei que essa descrição toda talvez pareça muito longa e tortuosa, mas é o único modo que consigo encontrar para transmitir a enorme radicalidade daquele instante, isto é, daquele encontro.

Creio, inclusive, que isso é outra daquelas obviedades que nós frequentemente esquecemos: as pessoas possuem uma dimensão que vai muito além daquilo que nós pensamos sobre elas. Nós temos uma enorme dificuldade de ver o outro enquanto outro, pois tendemos a projetar nossas emoções e expectativas em cima deles, em vez de prestar atenção no que está fora nós, percebendo o que há de novo e único no outro.

(Aliás, me parece que todas as grandes verdades são óbvias e, ainda assim, ou por isso mesmo, é sempre importante repetí-las.)

E era justamente isso que me passava pela cabeça naquele instante: aquele era nosso primeiro encontro. Nós éramos duas pessoas, olhando uma para a outra.

***

Sei que muitos falam de serem tomados por um imenso senso de responsabilidade ao se tornarem pais. Confesso que não senti isso. Talvez porque um dos meus traços de personalidade já seja ter um sentimento exagerado de responsabilidade — exagerado mesmo, no sentido de muitas vezes vir além do que é apropriado. Além disso, muito antes de Cecília nascer, mesmo antes dela ser concebida, eu já me sentia responsável por ela.

O que me chocou naquele momento foi a sua independência — como seus olhos se moviam rápidos pela sala, como seus dedinhos e bracinhos não paravam de se movimentar, como ela continuava simplesmente existindo, um segundo após o outro, independentemente de qualquer coisa que eu fizesse.

Ela não era mais “nossa” em certo sentido, mas estava ao nosso lado no fluxo da existência, indo conosco de um segundo para o outro, trançando a própria rota nessas três dimensões. Ou seja, o que me chocou aí foi o contrário da responsabilidade. Foi a minha pequenez diante do milagre da vida — agora ela também existia, e continuaria existindo, mesmo quando eu estivesse dormindo ou distraído, mesmo depois que eu morresse.

Toda aquelas preocupações, no fundo, traíam um desejo de controle, uma tentativa de garantir que tudo estaria bem para sempre — algo que pessoa alguma pode garantir, algo que podemos pedir a umaPessoa.

***

Seus olhos me chocaram também por outro motivo — eles eram idênticos aos olhos de Aline. A mesma vivacidade, o mesmo brilho — He never wanted to be away from her. She had the spark of life.

Mas esses olhos agora estavam em um corpinho pequeno, vulnerável, indefeso. Enquanto ela lutava para respirar, a precariedade daquela vida me impressionava — nada parecia mais importante, nada parecia mais frágil.

Um amigo disse que a experiência de ser pai era o “amor 2.0". De fato, havia algo que continuava e algo que mudava. Eram os mesmos olhos, mas era uma vida que estava no começo, cheia de possibilidades e desafios, de alegrias e sofrimentos, de conquistas e realizações.

E, sim, nesse sentido há um enorme sentimento de responsabilidade: eu tenho um papel nessa história, eu preciso cuidar dela — uma necessidade visceral e profunda.

Mas, como diz aquele personagem de Fargo, isso não é um fardo, mas um privilégio. Todos nós precisamos de uma missão. Eu estava diante da minha: proteger a bebê e a mãe até o fim dos meus dias.

Eu nunca tive uma missão tão clara. Eu nunca tive uma missão tão doce.

***

Felizmente, os momentos seguintes foram menos intensos — a bebê logo começou a respirar melhor e a nova mamãe foi se recuperando dos efeitos da cirurgia.

E aí começou algo totalmente diferente: do interlúdio metafísico mergulhei no extremo pragmatismo.

Não entrarei em muitos detalhes, pois esse texto já está ficando bastante longo. Mas o resumo da história é que as semanas seguintes me ofereceram inúmeras oportunidades para testar as minhas estratégias de resolução de problemas.

A vida nunca esteve tão concreta. Enquanto a minha esposa se recuperava da cirurgia e aprendia a amamentar — duas coisas mais difíceis do que geralmente se imagina — eu fazia um malabarismo para cuidar delas duas, da casa e do trabalho — desafios ainda maiores do que o normal, devido ao duplo isolamento da imigração e do lockdown. Não ter alguém por perto para segurar o bebê ou esquentar uma comida gera problemas não-lineares subestimados nesse tempo de isolamento: faltava tempo para as atividades mais básicas de manutenção do dia-a-dia.

Foram, de longe, as semanas mais cansativas de nossas vidas. Felizmente, em meio a toda a exaustão, fomos progressivamente resolvendo cada desafio, gradualmente criando uma rotina e a própria bebê foi ficando cada vez mais forte e precisando menos de cuidados constantes.

Ou seja, chegamos no fundo do poço e fomos aos poucos escalando o caminho de volta — o que só foi possível graças ao companheirismo e à convicção de que estávamos realizando uma missão muito maior do que nós mesmos.

***

Eu falei antes que ter uma missão é um privilégio — quero insistir nesse ponto, pois acho que isso explica muito da desorientação contemporânea. Uma das bençãos que recebi foi ter descoberto Viktor Frankl cedo e ter percebido que abraçar o dever daria um sentido muito mais sólido para a minha vida.

Todos os jovens pais me relatam algo parecido: logo após o anúncio da gravidez, todas as pessoas começam a fazer uma espécie de terrorismo psicológico, dizendo que agora o sujeito não terá mais liberdade, tempo, energia, etc. Eu entendo que parte desses avisos podem até nascer de um desejo sincero de prevenir o outro para as dificuldades que virão, mas me parece que muitas vezes é mais uma espécie de desabafo e modo de descarregar as próprias frustrações.

Eu só consigo explicar essas frustrações por um descompasso entre as tarefas que essas pessoas assumiram e como entendem o sentido das próprias vidas.

Quando você abraça a ideia de viver com propósito, realizando uma missão, essa questão de ter ou não liberdade perde o sentido. Por um lado, você tem toda a liberdade do mundo — pois está realizando seu propósito. Por outro, você não tem liberdade alguma — pois está realizando seu propósito. Ou seja, se você vive para algo, essa história de “tempo livre” é bobagem. Você está preocupado com algo mais importante.

Nesse sentido, embora seja realmente muito cansativo cuidar de um bebê, se ela não estivesse aqui, nós estaríamos “nos cansando” com outra coisa — e isso na melhor das hipóteses, pois a alternativa é não ter missão alguma, é não ter um “para quê”, o que é uma das principais fontes do sofrimento humano.

Ou seja, nossa vida já era cheia de responsabilidades. A única mudança com a chegada de Cecília foi uma reorganização das prioridades: pudemos agora deixar algumas coisas de lado, pois agora tínhamos uma nova missão. É a velha fórmula do Frankl: devemos nos concentrar naquilo em que é mais difícil nos substituir. Nesse momento, na nossa situação concreta, nossa grande missão é cuidar dessa bebezinha. As outras missões vão ter que ficar para depois ou para outras pessoas.

***

E poderia haver missão mais doce?

Descrevo um último episódio. Chego no quarto e minha esposa está com dificuldade de colocar a bebê para dormir. Tento os meus truques de sempre e nada funciona. E aí levanto uma hipótese: será que ela não está querendo fazer algo?

A hipótese é improvável porque, bem, ela ainda é muito pequeninha para tentar fazer qualquer coisa. Mas resolvo tentar e fico balançando um brinquedinho diante dele. Ela então se contrai toda, fazendo um esforço aparentemente com todos os músculos do corpo e…. pam!, acerta com a mão no brinquedinho — a primeira vez que ela consegue controlar o próprio braço e direcioná-lo a um objeto…. aparentemente surpreendendo ela mesmo no processo. O susto, inclusive, a faz cair no choro e, logo depois, no sono.

Em outro instante, a mesma dificuldade de dormir volta, então repito o truque, pensando que ao menos a fará dormir. O mesmo processo: concentração intensa, contração do corpo inteiro e… pam!, um tapa no brinquedo. E depois outro. E depois outro. Virou passeio. Ela então se virou para mim e deu uma enorme risada, entusiasmada em ter descoberto o próprio poder sobre o mundo.

E, claro, logo começou a chorar de cansaço e adormeceu no meu colo, exausta.

Repito: pode haver missão mais doce?

Toda missão é um privilégio, mas essa é certamente a melhor missão que recebi.

Só me resta repetir…

Obrigado, Senhor, por essa graça imerecida. Me ajude a cuidar de Aline e Cecília, permita que nossos dias juntos sejam longos, e que, ao final deles, nós nos reencontremos em sua Presença — pois o amor é grande demais para uma vida.

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